Artigo: Convertei-vos e Crede no Evangelho

50

* Por Cardeal Orani João Tempesta,

Arcebispo de São Sebastião do Rio de Janeiro (RJ)


Estes domingos do Tempo Comum que sucedem o Tempo de Natal nos conduzem aos inícios da pregação de Jesus: o chamado à conversão, o anúncio do Reino, o chamado dos primeiros discípulos e os primeiros sinais diante da missão que se inicia com a vida pública do Mestre. Podemos sentir o mesmo neste Terceiro Domingo do Tempo Comum.


O início da atividade apostólica de Jesus, para São Marcos, é um convite à conversão (Mc 1, 14-20). Diz Jesus: “O tempo já se completou e o Reino de Deus está próximo. Convertei-vos e crede no Evangelho!” (Mc 1, 15). Acabou-se o tempo das promessas e da espera: O Messias chegou e está começando o seu ministério! A sua presença é a plenitude dos tempos, tornando-os veículos da misericórdia de Deus e da história da salvação.


Mas, há algo surpreendente nesse alegre anúncio de Jesus: logo após afirmar que o Reino chegou, o Senhor intima o povo: “Convertei-vos e crede no Evangelho”! O Reino será Boa-Notícia para quem abrir-se à surpresa inquietante do Deus que Jesus anuncia. Acolher a novidade, a Boa-nova, o Evangelho, acolher esse Deus que chega exige que saiamos de nós mesmos, como os ninivitas que, escutando o apelo de Jonas, converteram-se! Mais tarde, Jesus irá criticar duramente o seu povo: “Os habitantes de Nínive se levantarão no Julgamento, juntamente com esta geração, e a condenarão, porque eles se converteram pela pregação de Jonas. Mas aqui está alguém que é mais do que Jonas”! (Mt 12,41).


Como é importante a Palavra deste Domingo! Cheios de nós, adormecidos e satisfeitos com nossos pensamentos, com nossa lógica cômoda, jamais poderemos acolher o Reino em nós e experimentar sua alegria e sua paz! Portanto, a primeira palavra do Senhor no Evangelho é “convertei-vos!” Não é possível domar Jesus, não é possível um cristianismo sob medida! Não é por acaso que o Evangelho de hoje começa falando da prisão de João Batista, aquele santo profeta que preparou a vinda do Reino.


O Reino sofre violência; violência do mundo, violência do nosso coração envelhecido pelo pecado, da nossa razão fechada para a luz do Cristo. Por isso mesmo, logo após apresentar o apelo de Jesus, São Marcos nos fala da vocação dos quatro primeiros discípulos. Certamente, esse chamado é compreendido de modo muito particular, como se referindo à vocação sacerdotal, que faz dos chamados “pescadores de homens”. Mas, esse chamamento indica, também, a vocação de todo cristão: seguir Jesus no caminho da vida. Nesse sentido, a lição é clara: seguir Jesus exige deixar tudo, deixar-se e colocar a vida em relação com o Senhor! Somente assim poderemos acolher o Reino.


Para acolher Jesus, a condição primeira é a conversão, a mudança profunda de vida que exige, sobretudo, a luta contra o pecado e, consequentemente, a rejeição de tudo aquilo que o pode desviar do amor e da Lei de Deus. Uma conversão parecida à que Deus exigiu à cidade de Nínive, por meio da pregação de Jonas, e que os seus habitantes praticaram, abandonando “o seu mau caminho” (Jn 3, 10). Mas, a fuga do pecado é apenas a primeira fase da conversão anunciada por Jesus, que exige também um segundo momento, que é destacado no Evangelho: “Acreditai na Boa-Nova”. O cristão tem que aderir positivamente ao Evangelho com uma fé vivificada pelo amor, que não se fica apenas na sua aceitação teórica, mas procura evidenciá-lo com a vida prática. É necessário e urgente, pois, deixar de lado a mentalidade terrena que faz com que o homem viva e atue apenas com vistas à felicidade e aos interesses temporais. “A aparência (a figura) deste mundo passa”, adverte São Paulo (1 Cor 7, 31).


Convertamo-nos! Levemos a sério que o modo de pensar e sentir de Deus não é o nosso! Tenhamos a coragem de nos deixar por Cristo. São Jerônimo, comentando a atitude dos quatro primeiros discípulos chamados pelo Senhor, afirma: “A verdadeira fé não conhece hesitação: imediatamente ouve, imediatamente crê, imediatamente segue…” Seja assim a nossa fé no Senhor, seja assim nossa adesão ao nosso Salvador! Então, seremos felizes de verdade, por que perceberemos que o que Cristo nos trouxe é uma Boa Notícia, a melhor de todas: Deus nos ama, caminha conosco e, no seu bendito Filho, nos convida à amizade íntima com Ele nesta vida e por toda eternidade! Amém.