Artigo: Ano da Paz

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* Por Dom Jaime Spengler,

Arcebispo de Porto Alegre


A presença de Deus na terra dos homens é anunciada com uma exclamação e desejo de paz: “Glória a Deus no mais alto dos céus e na terra, paz aos que são do seu agrado” (Lc 2,14).


Paz é o que desejam e pedem todas as pessoas de “boa vontade”. A paz é bem precioso, porém frágil e delicado. Há sinais preocupantes em nossa realidade nacional que exigem reflexão, oração, diálogo e decisão. Há de fato de se perguntar por que tanta violência, presente em todos os estratos da sociedade? Uma possível razão dessa situação nos oferece o Papa Francisco: “Os ídolos do domínio e do poder deterioram as relações, arruínam a harmonia a ser construída com humildade serviçal e disposição maternal. Os conflitos, a violência, a indiferença diante da morte nascem do fascínio do domínio e do poder”.


O domínio do poder econômico continua excluindo e produzindo desigualdade. Ouve-se dizer que “o crescimento econômico, favorecido pelo livre mercado, consegue por si mesmo pro­duzir maior equidade e inclusão social no mun­do. Esta opinião, que nunca foi confirmada pelos fatos, exprime uma confiança vaga e ingênua na bondade daqueles que detêm o poder econômico e nos mecanismos sacralizados do sistema eco­nômico reinante. Entretanto, os excluídos con­tinuam a esperar” (Papa Francisco, EG, 54).


O poder político necessita de pessoas capazes de promover o sempre necessário e autêntico diálogo entre os participantes da vida social, a fim de buscar indicações viáveis que favoreçam o saneamento “das raízes profundas, e não a aparência dos males” da sociedade. “A política, tão denegrida, é uma sublime vocação, é uma das formas mais preciosas da caridade, porque busca o bem comum.”


Manifestam-se sinais preocupantes de descrédito das instituições. A falta de ética na política e na economia, as expressões contundentes de corrupção em alguns setores públicos, o desrespeito pelos genuínos anseios do povo, a falta de um projeto de nação objetivo e claro são indicações que merecem atenção, reflexão, debate, oração e opções.


Outra razão de tanta violência é certamente a drogadição que atinge uma parcela preocupante da sociedade. O tráfico de drogas ilícitas está se tornando um poder paralelo dentro do Estado. Essa realidade não é mais uma ameaça; é realidade verificável cotidianamente.


A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil promove em 2015 o Ano da Paz. Há, certamente, quem se pergunte: “É possível percorrer o caminho da paz? Podemos sair desta espiral de dor e de morte? Podemos aprender de novo a caminhar e percorrer o caminho da paz?”.


A resposta à pergunta não é fácil. No entanto, através do engajamento de pessoas de “boa vontade”, poder-se-á favorecer o surgimento e a consolidação de iniciativas verdadeiramente marcadas pelo desejo de salvaguardar e promover a vida humana: uma vida digna, justa, em paz com Deus, com a natureza e com os irmãos e irmãs. Assim, a tão deseja e querida paz será possível para todos.


É urgente fomentar a cultura da paz. Ela se tornará realidade quando houver vigorosa decisão em favor de uma educação para crianças, adolescentes e jovens orientada por valores, virtudes, ética. A educação dessa parcela preciosa da sociedade não pode estar sujeita a opções e decisões de alguns poucos. É imprescindível participar de perto da vida cotidiana das unidades de ensino, ou ver a situação e a condição de tantos e tantas que ainda acreditam na força e dignidade da educação. A educação não pode estar orientada somente para o mercado de trabalho! Faz-se urgente atenção para com o humano. Faz-se necessário, ainda uma vez, recordar que a família estável é lugar privilegiado de fomento do humano e promoção da cultura da paz.